Trilha sonora, um dos textos do livro DIÁRIO DE UM SALAFRÁRIO, na voz de Eliane Gonzaga.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

A bela da tarde

Ainda a primeira vez. Ela o recordava, com todos os cheiros, com toda a minúcia, desde o primeiro beijo até a forma com a qual ele cobriu o corpo dela depois da entrega que os dois tiveram.

Lembrou também da própria reação que ela teve naquele dia. Olhou, com ar carinhoso, para todos os cantos, e em seguida fechou os olhos, chegando a apertá-los para que nenhum detalhe de tudo o que acontecia escapasse de sua memória.

E não escaparam, mesmo depois de tantos anos. Quando estava entediada, recorria a ele. Fechava as cortinas, se despia por inteira na frente do espelho e se deitava. Suas mãos seguiam todo o trajeto que as mãos dele percorreram por seu corpo.

Passava a língua nos dedos para que as pontas deles acariciassem seus bicos, e em alguns momentos sentia o mesmo molhar que a saliva dele entregou à parte mais delicada de seu corpo. Com as mãos molhadas descendo delicadamente por sua barriga, arrepiando seus pelos e arrepiando a sua espinha de tanto desejo.

Aos poucos, os dedos se aproximavam mais de seu corpo, do mesmo jeito que o rosto dele passou por ela alguns anos antes. Dava seus primeiros sussurros e já sabia que estava pronta para sentir as carícias mais íntimas. Do mesmo jeito que ele fez em sua primeira vez.

Acontecia instintivamente. Sempre. A cada carícia íntima, recordava o que os dois fizeram anos, décadas atrás. Fazia tanto tempo, mas no coração era uma página que ela jamais queria virar em sua vida. E se desdobrava, tentando reconstituir tudo o que ele fez, todo o cuidado e a vontade de deixar que ambos os prazeres acontecessem em um tempo só.

Ela gemia, com os olhos fechados em sonho de menina diante das primeiras realidades de mulher. E vinham as realidades. Tudo o que imaginava estava prestes a se realizar, mais uma vez, naquela tarde de tédio, todo o prazer, como se fosse a primeira vez.

Deu um, dois gemidos, e começou a senti-lo cuidando de seu desejo mais íntimo. E rolava na cama, sentindo seu corpo colado ao dele. Instintivamente, dizia “se segura em mim”, do mesmo jeito que ele sussurrou antes de, com suas mãos fortes mas cuidadosas, se colocar por baixo dela.

Procurava sempre se lembrar da sensação que teve quando ele a deixou por cima, e só conseguia se sentir plena se, na hora de ficar de bruços na cama, sentisse uma certa vertigem. Vertigem que ele quebrou com um beijo e uma carícia na nuca. E que ela procurava recriar enquanto dava pulos e sussurros na cama.

Passava a língua em seus próprios lábios, nos mesmos carinhos que guardou da primeira vez. Deu seu primeiro sobressalto e novamente se deitou na cama. Apoiou sua cabeça em dois travesseiros e se preparou para sentir novamente ele.

Deu o primeiro, o segundo, o terceiro sobressalto. E se agarrou ao travesseiro, tapando os olhos para tornar a ver a imagem dele, sorrindo e deixando sua testa sobre a testa dela para dar seu último sobressalto de prazer junto a ela.

Ela ainda sentiu a mordida dele em sua orelha antes do último grito de prazer. Ainda ofegante, se escondeu debaixo das cobertas, ainda de olhos fechados, sorrindo e dizendo palavras de amor para ele.

Deu um suspiro mais fundo e abriu os olhos. A vista alcançou o relógio digital na cabeceira. Seu sorriso deu lugar à preocupação. Ainda tinha uma hora até o marido chegar. Precisava ajeitar a cama, tomar um banho e começar os afazeres domésticos. Hoje é dia de filé. Lembrou que precisava descongelar dois pedaços, a quantidade que ele costuma comer toda noite.

Por um momento, teve um sentimento de culpa, achou que estas constantes lembranças eram uma forma de trair o marido. Gostava dele, apesar do entusiasmo de antes não existir mais. Mas o sabor de lembrar sua primeira vez a cada tarde era um luxo ao qual dava para seu próprio prazer. Ao menos podia sentir-se um pouco mais bela a cada tarde passada na companhia de seu tédio.

6 comentários:

Feer Amaral disse...

Nossa... me senti como a moça do conto que acabei de ler...Cara, tu escreve divinamente...!!
Ah sim, eu descobri o seu blogg atraves de outro blogg, "sua excelencia, o canalha"...e achei superinteressante o titulo do seu, e resolvi dar uma garimpada p ver o que tinha de bom! Como eu ja disse, gostei mto do jeito como vc escreve, vi uns textos a la peça de teatro... amei mesmo!!
Adoraria trocar ideia com vc... passa no meu!! (que não é nada perto do que vc escreve por aqui... )

BjO Feefeh!!

Anônimo disse...

.............. VINICIUS FAUSTINI ...

VINICIUS ....NOSSA !!!!!!!COMO GOSTEI ..ESTAVA TÃO COMPENETRADA EM LER QUE ME DEU A SENSAÇÃO DE ESTAR VENDO ESSA PESSOA QUE AMA TANTO O MARIDO NÃO COM A INTENSIDADE DA SUA PRIMERIA VEZ .............MAS O AMOR É LINDO . EXISTE ALGO MARCANTE NA VIDA DA PESSOA QUE É INESQUECIVEL MESMOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOO PODE PASSAR ANOS E ANOS ..PARABENS ESTOU ADORANDO SEU TRABALHO A EDITORA LITTERIS SABE NO QUE ESTÁ INVESTINDO NO SEU GRANDE FUTURO AMIGO ... PROFISSIONAL QUE FAÇO QUESTÃO DE ACOMPANHAR ADORO LER O QUE VC ESCREVE ................ ESTÁ LINDO MUITO BEM ESCRITO PARABENS VINICIUS FAUSTINI E OBRIGADO PELO CONVITE E SEMPRE NOVIDADES ME DÁ UM AVISO NO BLOG DO MAESTRO OK ....E A DE HOJE ESTÁ MELHOR DA PRIMEIRA QUE LI E ADOREI VC ESTÁ SE AFLORANDO CADA DIA MAIS ... NA SUA VIDA PROFISSINAL .............. GOSTEI MUITO .! AGUARDO EM BREVE NOVIDADES ..........!

ABRAÇOS
a lituana a fã n 1 DO MAESTRO EDUARDO LAGES DE SP/CAPITAL .

Patricia Guimarães disse...

Parabéns, Vinicius! O conto é mesmo muito envolvente, assim como os outros que li no blog. Prendem a atenção do início ao fim.
Beijos, sucesso!

Feer Amaral disse...

Vinicius.. olá de novo.. hehehe...
bom, eu juro que quero um livro seu!! amo seus contos... como eu ja disse e não me canso de repetir... tô até pensando em fazer uma paradinha com textos poéticos no meu... mas ainda não sei... eu amo escrever poesia, mas meu estilo é bem "diferente", tenho influências do ultra romantismo, tipo Alvares de Azevedo, Lord Byron, são coisas meio pesadas, literatura Gótica tbm... ah mas sei la... sou uma junção de várias culturas, presas no corpo de uma roqueira... hehehe....
qualquer dia eu publico um texto e quero sua opinião...

BjoO. Paz e Força Sempre (frase que o grande Renato Russo escrevia em seu a autógrafos...copiei.. hehehe...)

sua mais nova admiradora..Fernanda Amaral!!

Armindo Guimarães disse...

Olá, Vinícius!

Que se dizer do conto? O mesmo que digo de todos os que li de ti.

Maravilha!

Grande abraço, pá!

Anônimo disse...

manero!