Trilha sonora, um dos textos do livro DIÁRIO DE UM SALAFRÁRIO, na voz de Eliane Gonzaga.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Catarse

Olhou a mensagem de texto dela no celular. Ela dizia que estava indo embora, partia rumo à Europa, ia buscar novas oportunidades de se tornar uma profissional ainda melhor em sua área. Ele chorou. Olhou para o relógio. Respirou fundo. Abriu a porta tão bruscamente que já estava descendo as escadas quando ouviu o "blam" dela batendo.

Desceu as escadas, passou pela portaria e praticamente se atirou na frente do táxi. Disse ao taxista: "aeroporto, o mais rápido que puder". A madrugada era sua aliada, ainda eram quatro e meia da manhã. Tinha uma hora e quinze até ela entrar no saguão de embarque. Foram 40 minutos entre seu apartamento e o terminal de voo. Correu nos arredores do aeroporto, atento a todas as mulheres que passavam com suas bagagens. Só conseguiu vê-la na hora em que estava se encaminhando para embarcar.

Correu, quase derrubando a mulher que vinha cheia de embrulhos no carrinho. Sentiu que não ia chegar a tempo. Sua voz poderia chegar primeiro. Gritou o nome dela. Ela estacou. Sorriu, surpresa. Perguntou o que ele estava fazendo ali. Sem fôlego, ele disse: "vim te ver".

Ela achou bonitinho ele ter ido se despedir. Apertou a bochecha direita, deu um beijo em sua testa e disse "tchau". Ele segurou seu braço, disse "espera". Pediu mais uma vez para ela não ir, prometeu mundos e fundos, talvez mais do que podia. Ela disse que tinha uma vida pela frente e a ambição de um novo mundo para conhecer e para conquistar. Ele disse que em nenhum lugar do mundo ela ia se sentir tão aquecida quanto nos braços dele. E disse mais. Disse que a amava. Ela disse que também o amava. E que ia guardar este amor para a vida toda. Mas que o cotidiano, os desejos, as aspirações, o mundo separaria seus corpos. E por tempo indeterminado.

Ele a beijou. Ela aceitou seu beijo, entreabrindo os lábios para sentir o gosto de sua língua. O amor renascia por alguns instantes, até o romantismo ser despertado pela voz do aeroporto, que dizia "última chamada". Com as mãos unidas, ela sorriu num lamento, dizendo que precisava ir. Os olhos dele marejaram, e sua voz emitiu apenas um "que pena que você vai".

Ela se encaminhou para o embarque. Ele virou as costas. Enfim ela iria embora, mas ele queria se poupar da visão dela partindo de uma vez. Caminhou a passos curtos, tentando digerir como seria a vida sem ela.

Atravessava a porta para pegar um táxi quando seu ombro recebeu um carinho. Era a mão dela. Virou-se bruscamente. Ela sorria, anunciando que descobriu que não precisava e que não queria mais ir. Os dois se abraçaram, girando de felicidade, para depois se entregarem ao beijo logo de um retorno de quem nunca se despediu. Fim.

Os letreiros subiram. Os olhos dele novamente se avermelhavam, como em todas as vezes que assistiu ao filme. Ele se emocionara mais uma vez com o final do casal. Mais uma vez estava ansioso para que seu desfecho fosse o mesmo do fim daquele filme barato que parecia tanto com sua vida. Desligou o DVD, a televisão, apagou as luzes e foi para a cama.

Com a luz da cabeceira acesa, releu o mais recente postal que ela havia mandado. Ela o chamava de "querido" e contava com muita felicidade que estava em Glasgow e ia se casar com um escocês natural de Edimburgo. Seu instinto era de rever o filme, para lá chorar de felicidade durante 100 minutos. Mas o sono falava mais alto, e só lhe restava, antes de adormecer, desejar que a catarse de um final feliz agora viesse povoar também os seus sonhos.

3 comentários:

James Lima disse...

Caramba...
Emocionou-me, parabéns !

Um Forte Abraço
James Lima
www.robertocarlos.vai.la

Márcia Tristão-Bennett disse...

Puxa Vinicius!!!!!!!!!

Adorei!!!!!!! Me emocionou tambem!!!!!!!! Ateh que enfim voce nos deu uma aliviada, neh???????

Parabens!!!!!!!!!

Beijos!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Carmen Augusta disse...

Olá Vinicius!

Como sempre me senti lá no aeroporto, e me emocionei bastante.
Me lembrou um final de um filme, com o qual nunca me conformei, Casablanca.Vi várias vezes, e em todas, chorei....

Parabéns meu amigo escritor!

Beijos,
Carmen Augusta