Trilha sonora, um dos textos do livro DIÁRIO DE UM SALAFRÁRIO, na voz de Eliane Gonzaga.

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Na farmácia

Esquete feita para ser apresentada no teatro O Tablado.

*****

Personagens
BALCONISTA 1
BALCONISTA 2
DONA GERTRUDES
ENFERMEIRA
GERENTE

A cena se passa numa farmácia. A Enfermeira entra em cena, dando apoio a uma senhora, que anda com dificuldade. O Balconista se prontifica.

BALCONISTA 1 (gentil) – Boa tarde. Em que posso ajudá-las?

DONA GERTRUDES (à Enfermeira) – Eu quero o meu mingau!

ENFERMEIRA – Shhh... Calma, dona Gertrudes. Estamos numa farmácia...

DONA GERTRUDES – Não interessa! Eu quero o meu mingau, copeiro. E com muita aveia!

ENFERMEIRA – Dona Gertrudes, ele não é copeiro. Ele é balconista da farmácia. (a ele, sem graça) Bem, o senhor desculpe...

BALCONISTA 1 – Correto... Eu compreendo. (tempo) O que a senhora deseja?

ENFERMEIRA – Bem, senhor... A minha paciente já está muito debilitada. Além das (vai apertando a dona Gertrudes, que geme a cada beliscão) dores no pescoço, no braço, na bacia, na barriga...

DONA GERTRUDES (interrompe, brusca) – Pára! Não precisa demonstrar as minhas dores pro moço...

ENFERMEIRA – Bem... O senhor vê o estado dela.

BALCONISTA 1 – Sim... Posso imaginar.

ENFERMEIRA – Pois bem... Além das dores, a dona Gertrudes tem narinas muito sensíveis e, por mais que se troque duas vezes por dia as fronhas do seu travesseiro, ela sempre passa o dia espirrando.

DONA GERTRUDES (protesta) – Isso não é verda... (espirra) Verdade (espirra) Eu tenho uma (espirra) saúde de (espirra) garota (espirra duas vezes).

ENFERMEIRA – Como você vê! (pausa) E o médico recomendou que ela use um travesseiro especial.

(Sugestão: ela pode seguir espirrando enquanto a Enfermeira fala)

BALCONISTA 1 – A senhora...

ENFERMEIRA (interrompe, se insinuando) – Senhorita.

BALCONISTA 1 (percebe e fica sem graça) – Senhorita... (tempo) Nós temos aqui um travesseiro sob medida para sua paciente. É o mais novo travesseiro anti-alérgico lançado no momento.

DONA GERTRUDES – O quê? (desesperada) Minha filha, vamos embora! Rápido, rápido!

ENFERMEIRA – O que houve, dona Gertrudes?

DONA GERTRUDES – Eu quero ir embora daqui! Esse homem é louco!

ENFERMEIRA – Acalme-se, dona Gertrudes...

BALCONISTA 1 – Algum problema?

ENFERMEIRA – Eu não sei...

Dona Gertrudes vai ficando ofegante.

ENFERMEIRA (revirando os bolsos) – Sua bombinha... Sua bombinha!

Dá a bombinha à dona Gertrudes, que se alivia.

DONA GERTRUDES – Aaaah... Já!

BALCONISTA 1 – A senhora está melhor?...

DONA GERTRUDES – Queria que eu morresse, né, seu assassino? (tenta partir para cima dele) Pensa que eu não percebi que existe um complô seu com esta garota! Vocês me matam e levam meu dinheiro!

ENFERMEIRA – Dona Gertrudes, pare com isso!

BALCONISTA 1 – Epa, sou um homem direito!

DONA GERTRUDES – Conheço muito bem seu tipo! Um homicida que se disfarça de farmacêutico só para atacar pessoas indefesas... Socorro! Estão tentando me matar! Socorro!

Balconista 2 entra em cena.

BALCONISTA 2 – Mas o que é que está acontecendo aqui?

DONA GERTRUDES – Oh, ainda bem! Uma menina que parece ter bom coração!

BALCONISTA 2 (ao Balconista 1) – Do que é que ela está falando?

BALCONISTA 1 – Eu sei lá!

DONA GERTRUDES – Confessa, seu assassino! Confessa! (à Balconista 2) Minha filha, este sujeito estava querendo me matar...

ENFERMEIRA – Dona Gertrudes, pare com isso!

DONA GERTRUDES – Pensa que eu não sei do plano diabólico de vocês?

ENFERMEIRA – Não tem plano nenhum, dona Gertrudes! (à Balconista 2) A senhorita não me leve a mal, mas ela está caducando...

BALCONISTA 2 – Alguém pode me explicar?

BALCONISTA 1 – Olha, foi o seguinte. Esta senhora...

ENFERMEIRA – Senhorita!

BALCONISTA 1 – Senhorita. Ela veio fazer um pedido e aí veio esta velha...

DONA GERTRUDES – Velha é a vovozinha!

BALCONISTA 2 – Tá, tá, deixa! (ao Balconista 1) Deixa que eu atendo ela...

BALCONISTA 1 – Mas, mas...

BALCONISTA 2 – Você é muito mal educado, só sabe assustar as pessoas!

BALCONISTA 1 – Pior você que ta querendo ganhar o cliente só pra ganhar o título de funcionária do mês!

DONA GERTRUDES – Ei, vem cá! Eu não tenho o dia inteiro!

ENFERMEIRA (repreendendo) – Dona Gertrudes!

DONA GERTRUDES – Mas eu quero o meu mingau!

ENFERMEIRA – Dona Gertrudes!

BALCONISTA 2 – Senhora, estou aqui para atendê-la...

BALCONISTA 1 – Ah, é assim, é?

DONA GERTRUDES – Vai embora, seu nazista!

BALCONISTA 1 – Olha aqui! Vocês tão ferindo a minha dignidade! Eu vou chamar o gerente... (sai)

BALCONISTA 2 – Bem, as senhoras desculpem. Espero que isto não se repita.

ENFERMEIRA – Posso fazer o pedido?

BALCONISTA 2 – Pois não.

DONA GERTRUDES – Lá vamos nós de novo...

ENFERMEIRA – A minha paciente já está muito debilitada. Além das (vai apertando a dona Gertrudes, que geme a cada beliscão) dores no pescoço, no braço, na bacia, na barriga...

DONA GERTRUDES (interrompe, brusca) – Pára! Eu já falei que não precisa demonstrar minhas dores pra elas!

BALCONISTA 2 – E a senhora tem a receita do remédio?

ENFERMEIRA – Mas não é remédio pra dor que eu vim comprar aqui. É que a dona Gertrudes tem narinas muito sensíveis e, mesmo sendo trocadas duas vezes por dia as fronhas do seu travesseiro, ela sempre passa o dia espirrando.

DONA GERTRUDES (protesta) – Eu já falei que (espirra) é mentira (espirra), eu tenho uma (espirra) saúde (espirra duas vezes) de ferro (espirra três vezes).

ENFERMEIRA – O médico recomendou que ela use um travesseiro especial.

(Sugestão: ela pode seguir espirrando enquanto a Enfermeira fala)

BALCONISTA 2 – Ah, claro! Meu Deus, uma coisa tão simples e o meu colega de trabalho fazendo este escândalo!

DONA GERTRUDES – Ele é um criminoso!

BALCONISTA 2 – Dona...

DONA GERTRUDES – Gertrudes, minha filha!

BALCONISTA 2 – Dona Gertrudes, cá entre nós... Ele está assim porque a nossa gerente está prestes a mandá-lo embora.

DONA GERTRUDES – Ah, sim? Bom, com razão, é um incompetente e criminoso!

BALCONISTA 2 – Certo, mas aqui eu tenho produto especial pra senhora, dona Gertrudes! Um travesseiro que é anti-alérgico!

DONA GERTRUDES – Oh! (faz menção de desmaiar)

ENFERMEIRA – Está se sentindo bem, dona Gertrudes?

BALCONISTA 2 – O que houve?

DONA GERTRUDES – Cínica! Você também é cúmplice!

BALCONISTA 2 – Eu não estou entendendo!

DONA GERTRUDES – Vocês são todos uns genocidas! Querem exterminar a minoria da população!

BALCONISTA 2 – Claro que não, dona Gertrudes...

ENFERMEIRA – Dona Gertrudes, isto não tem graça!

DONA GERTRUDES – Não tem graça porque o plano diabólico de vocês não está dando certo!

BALCONISTA 2 – Eu...

DONA GERTRUDES – Seus facínoras! Querem me derrubar! Mas eu sou esperta! Dura na queda!

BALCONISTA 2 – Mas o que é isso?

DONA GERTRUDES – E você, garotinha! Se faz de minha amiga, mas quer é preparar o meu caixão!

BALCONISTA 2 – Não, eu...

ENFERMEIRA – Não leve a mal, por favor!

DONA GERTRUDES – Não precisa justificar! Eu sei de tudo... Até tu, Brutus, filho meu?

BALCONISTA 2 – Eu não estou entendendo...

ENFERMEIRA – Acho que está na hora do seu remédio, dona Gertrudes!

DONA GERTRUDES – Fica longe de mim, sua... Sua criminosa! Sei muito bem que você colocou arsênico no meu remédio!

ENFERMEIRA – Dona Gertrudes... Assim, a senhora também me ofende!

DONA GERTRUDES – Em que mundo nós estamos? Jovens querendo matar uma velhinha indefesa!

ENFERMEIRA – Não, dona Gertrudes...

DONA GERTRUDES – É sim! E da pior forma!

BALCONISTA 2 – Ai, não estou me sentindo bem...

DONA GERTRUDES – Usando o pretexto de que eu sou alérgica! Assassinas! Genocidas! Suas, suas... paquidermes!

ENFERMEIRA (gagueja) – Do-do-dona Ger-tru... (desata a chorar)

BALCONISTA 2 – A senhora aceita um calmante?

ENFERMEIRA – Dois!

DONA GERTRUDES – Tomara que tome um calmante envenenado...

Entram o Balconista 1 e a Gerente.

BALCONISTA 1 – Foi ela! Foi essa velha nojenta que me chamou de bandido!

DONA GERTRUDES – Me respeita! Nojenta posso até ser, mas velha é a vovozinha!

A Enfermeira tenta disfarçar as lágrimas e esboça um sorriso insinuante pro Balconista 1.

GERENTE – Senhora... Desculpe a indelicadeza do meu funcionário...

DONA GERTRUDES – Se ele não for sumariamente despedido, não ponho mais os pés nesta espelunca!

GERENTE – Um momento, senhora... O que ele fez de errado?

DONA GERTRUDES – Meu filho... É que eu, além das minhas dores... eu tenho (espirra) muita (espirra) aler... (espirra) gia. E eu queria um (espirra) travesseiro (espirra) pra me (espirra) fazer (espirra três vezes) passar o dia bem.

GERENTE – Correto.

DONA GERTRUDES – E este (espirra) delinqüente (espirra) em vez de (espirra) me dar um (espirra) remédio (espirra) disse que ia colocar uma arma pra me matar.

GERENTE (ao Balconista) – É verdade isso?

DONA GERTRUDES – É sim! (ao Balconista) Confessa, seu nazista! Se você é homem, revele seus planos megalomaníacos para exterminar os alérgicos de todo mundo.

BALCONISTA 1 – Mas eu não fiz nada!

DONA GERTRUDES – Covarde! Só porque eu sou indefesa!

BALCONISTA 1 (quase chorando) – Eu sou inocente!

DONA GERTRUDES – Genocida de marca maior! Confesse, exterminador! Seu Schwarzenegger!

GERENTE – Por favor, a senhora se acalme... Eu mesmo trago a solução para seu problema.

DONA GERTRUDES – Ah, obrigada, filhinha. Deus lhe abençoe!

GERENTE (pega um travesseiro) – Aqui está o mais eficaz travesseiro ANTI-ALÉRGICO...

DONA GERTRUDES (se desespera) – Aaaah! Socorro! Eles são uma quadrilha! Querem me matar!

Dona Gertrudes sai correndo desesperada, pedindo socorro. Os quatro ficam sem entender nada.

PANO

Um comentário:

CON disse...

Amigo, comecei a ler e nao consegui parar...Imaginando a cena, rsrsrsr
Muito legal!!!!
Beijos azuissss