Trilha sonora, um dos textos do livro DIÁRIO DE UM SALAFRÁRIO, na voz de Eliane Gonzaga.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Das flores de setembro

Separou uma, duas, três, uma dúzia de flores. Arranjou papel e caneta, e depois de alguns rascunhos, enfim conseguiu dizer exatamente o que gostaria de falar pra ela - bom, ao menos chegou perto, sabia que o coração dele estava tão apaixonado que não conseguia alcançar o manuscrito.

Olhou a folhinha do calendário, cantarolou aquela música que dizia que quando entrar setembro vem a boa nova. Suspirava entre sorrisos com aquele fim de mês, com aquela bela sensação de ter o coração invadido, daqueles traços de mulher que se desenharam sem pedir licença na sua alma de pretenso escritor. Para o sujeito que tinha começado o mês na companhia da solidão e das frustrações que tentava amenizar através de seus escritos, ele era outro.

Ela era a outra. A outra certeza de que o amor poderia existir, de que as desilusões não são necessariamente constantes na vida de uma pessoa. A conhecera pra se reconhecer. E ela estendara a mão dizendo "vem". Mesmo calejado por alguns sofrimentos, naquele setembro ele aceitara com um "sim" maiúsculo adentrar naquele jardim e conhecer cada flor que ela o apresentasse e o contasse enquanto o guiasse pela mão.

Lembrou-se de colocar um perfume, coisa que ele não tinha hábito de fazer - e ele achava inútil tentar se perfurmar, sabia que qualquer cheiro seria ofuscado por aquele frescor que vinha do hálito dela. Contou as flores, releu o cartão. Pegou o elevador, saiu de casa e seguiu rumo ao local do encontro.

Esperou-a um pouco, na sua mania de chegar mais cedo do que o combinado (ainda na tensão de saber se ela vinha ou não, ou se viesse não iria embora logo ao vê-lo assim tão comum, um mero apaixonado e pretenso autor). Mas, sim, ela veio.

Olhou diretamente em seu olhar, e quase se sentiu cego diante do fascínio de seus olhos claros. Riu quando percebeu que ela trazia nos lábios um sorriso. Ele se ajoelhou. Afagou as flores antes de colocá-las nas mãos dela. Sentiu que o buquê, o bilhete e até ele mesmo eram insignificantes diante de tanto que ela é.

Mas, pela primeira vez em sua vida, não quis se esconder, nem atrás das letras, nem nas paredes de sua casa. Não tinha receios. Estava lá, hipnotizado, diante da primavera que vinha na forma de musa, na imagem daquela mulher vinda das flores de setembro.

2 comentários:

Márcia Tristão-Bennett disse...

Ai que lindo.......!!!!! marcando presenca!!!!!!


Abracos

Armindo Guimarães disse...

Gostei.

Abraços